sábado, 21 de abril de 2012

E se a Capital do Brasil ainda fosse o Rio de Janeiro?





O Lula já estaria com muita gente protestando na sua porta.” Essa foi a primeira idéia que veio à cabeça do cientista político Carlos Novaes ao pensar no cenário do Rio de Janeiro como sede do atual governo. De fato, se a capital ainda estivesse à beira-mar, a pressão popular sobre as decisões do governo federal seria muito maior do que se vê em Brasília. O adensamento urbano carioca possibilitaria a reunião de grandes massas em movimentos reivindicatórios. Basta dizer que no Rio vivem hoje cerca de 4 600 habitantes por quilômetro quadrado. Em Brasília, o número cai para 350.
E esse contingente seria bem maior se a Cidade Maravilhosa ainda abrigasse a administração federal. De 1960, ano da transferência da capital, a 2000, data do último censo, a população carioca foi a que menos cresceu entre as capitais. Não se pode afirmar que o Rio acompanharia o ritmo de crescimento de São Paulo, nem que receberia os migrantes que povoaram Brasília. Afinal, a capital paulista passou por uma explosão demográfica incomum, motivada pela industrialização, e o novo Distrito Federal nasceu do nada, atraindo muita gente interessada na sua construção. Mas pode-se dizer que a mudança da capital estimulou dois tipos de movimento, que contribuíram para o esvaziamento do Rio: imigrantes passaram a preferir destinos como São Paulo e Brasília, em vez da antiga capital, e antigos moradores emigraram, alguns envolvidos com a burocracia federal, outros pela queda da qualidade de vida na cidade.
De fato, a perda do status de capital levou consigo o dinheiro ligado à presença da burocracia, gerando um empobrecimento da cidade, que culminaria, ao longo dos anos, no crescimento da informalidade e na escalada da violência. Segundo o sociólogo Luís Antônio de Souza, do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, a presença do poder público federal poderia ter evitado muitas das agruras sofridas pelos cariocas nos últimos 40 anos. “Poderia haver maior controle sobre o tráfico de drogas e armas, com a presença dos Três Poderes”. Souza não descarta, entretanto, um outro panorama, muito mais pessimista. Como capital, o Rio receberia um fluxo maior de imigrantes, veria crescer ainda mais as favelas e subúrbios e as áreas mais ricas e seguras se isolariam definitivamente. “Nesse caso, a cidade seria ainda mais violenta.”
Ao mesmo tempo em que o Rio de Janeiro se esvaziava, Brasília crescia, baseada em vultosos empréstimos externos e financiamento inflacionário. Calcula-se que a construção do novo Distrito Federal tenha custado de 2% a 3% do PIB, ao longo dos quatro anos de obras. Em valores atuais, isso representaria um investimento de 6 a 10 bilhões de reais por ano, valor semelhante ao Orçamento anual da cidade do Rio, calculado em 8 bilhões de reais para 2003. Ou seja, sem Brasília, nossa dívida externa com certeza seria menor e, conseqüentemente, os juros, hoje, seriam menores.
Mas a construção de Brasília teve outras conseqüências, além de onerar as contas públicas. Primeiro, estimulou o povoamento de algumas regiões do Centro-Oeste, principalmente no entorno da nova cidade e ao longo das rodovias construídas para ligar a capital ao resto do país. Sem esse impulso, o interior do país ainda seria uma espécie de faroeste, uma terra meio sem lei, isolada por milhares de quilômetros do centro de poder. Além disso, a mudança da capital pariu uma classe profissional que se nutriu não só de muito dinheiro, mas de poder para interferir na vida política brasileira: os empreiteiros. “Houve muita promiscuidade no trato com esse tipo de empresário”, afirma Maria Victoria Benevides, cientista política.
Brasília, no entanto, não gerou apenas problemas políticos e econômicos. No Planalto Central nasceram, a partir dos anos 80, algumas das principais bandas do rock brasileiro. Segundo o crítico Arthur Dapieve, “a porção mais politicamente engajada do nosso rock nasceu ali”. E não foi por acaso. A proximidade do poder, o contato com culturas estrangeiras por meio de filhos de embaixadores e o fato de a maioria dos roqueiros brasilienses ter pais ligados ao funcionalismo público são algumas razões para o surgimento desse movimento no Distrito Federal. Sem isso, adeus aos versos de Legião Urbana, Plebe Rude, Capital Inicial e Raimundos.

FONTE: Site da Revista SUPER